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2003/07/29

Música: Parabéns Sr.ª Ekdahl! 

Há vozes que nos fazem voar. Lisa Ekdahl tem uma dessas vozes. Com um timbre único, uma leveza quase infantil, descobrir os seus discos é como mergulhar no melhor do jazz tornado tão acessível como qualquer canção pop. Para quem não a conhece, a Sr.ª Ekdahl nasceu em Estocolmo, canta e faz hoje 32 anos. Nos anos 90 lançou a sua carreira na Suécia, tornando-se uma superstar em 1994 com apenas 23 anos. O resto do mundo só a conheceu mais tarde, quando começou a gravar standards de jazz em inglês com o trio de Perter Nordahl.

De todos os discos dela que conheço, prefiro o Lisa Ekdahl Sings Salvadore Poe. E basta ouvir este disco uma vez para os sons de Daybreak, a primeira faixa do álbum, ficarem para sempre na nossa memória. Que tenha uma longa vida Sr.ª Ekdahl e que não perca essa voz única que nasceu em 1971!

2003/07/24

Blog: O 5 Minutos já tem um mês 

O tempo voa e já passou um mês. Durante este tempo tivemos perto de 1.700 visitas, o que dá a bonita soma de quase 60 por dia. Ultimamente o ar do verão tem reduzido a frequência das actualizações mas por aqui continuamos. Obrigado por passar por cá 5 minutos de vez em quando!

2003/07/22

Música: A leveza dos islandeses 

Primeiro: impressiona a capa do CD. Branco, cinza, sem indicações mais que o nome e o site, apenas um autocolante que se pede seja retirado assim que se comprar.
Segundo: começa-se a ouvir e só há dois caminhos possíveis após os primeiros minutos; tirar o CD e oferecê-lo a alguém com mais paciência que nós, ou imediatamente reconhecer um lugar especial para ele na nossa prateleira.
Terceiro: Como raios se faz um albúm em que nenhuma das palavras cantadas tem significado?

Refiro-me com este intro ao album () dos Sigur Rós, que conheci, infelizmente, apenas há dois dias. [O que ando eu a perder??]

Como usar esta pérola da música? > Colocar os auscultadores, fechar todas as luzes, abrir um bom vinho e ouvir, ouvir, ouvir...

Não me parece que se deva explicar mais por palavras. Seria uma afronta ao trabalho dos Sigur Rós.

2003/07/17

Livros: A noção de raça é uma ficção 

No seu segundo livro, "Race, Colour and the Processes of Racialization", Farhad Dalal propõe uma ideia que contraria o senso comum instalado na nossa sociedade. Dalal afirma que a noção de raça aplicada aos seres humanos não tem qualquer base factual ou científica e que não passa de uma construção social para manter as relações de poder entre grupos de pessoas. Uma ideia provocadora mas extremamente bem defendida.

Partindo da sociologia, da psicanálise e da grupanálise, o autor procura encontrar sentido na forma como as percepções sociais de raça e de racismo evoluiram, chamando racialização a esses processos de transformação. A sua argumentação é profundamente influenciada por Siegmund Foulkes, o pai da grupanálise, e pelo sociólogo Norbert Elias. Seguindo o exemplo que Elias deixou com a sua investigação sobre o processo civilizacional, Dalal explorou como os significados associados às palavras "branco" e "preto" evoluiram desde a idade média e revela, através deste exercício, a forma como a linguagem serve para transmitir opiniões valorativas de geração em geração.

Mas a parte mais estimulante do livro é quando ele nos leva a questionar a própria forma como a nossa sociedade actual continua a utilizar os mesmo mecanismos de sempre para separar os conceitos de "nós" e "eles". A nota final, adicionada à última hora, é uma análise muito perspicaz sobre o 11 de Setembro e sobre a forma como continuamos a "construir monstros".

2003/07/14

Livros: Nudez e Pudor - o mito do processo civilizacional 

Começa a leitura pela curiosidade, depois vem um conjunto de factos que nos agarram. Hans Peter Duerr escreve de forma simples e directa, conjugando Sociologia e Antropologia, acerca da forma e necessidade do Homem distanciar o seu lado animal jogando com a sua nudez e reacções a esta. Desde a Grécia, passando com especial cuidado pela Idade Média, costumes e castigos são apresentados de forma a ser possível entender um pouco melhor a evolução Humana e da Sociedade.

Um excelente livro, não só para os estudiosos da matéria, mas também para os curiosos da natureza Humana.

"Nudez e Pudor, o mito do processo civilizacional", Hans Peter Duerr, Editorial Notícias, 2002 (1988)

Música: Hail to the thief 

Encoste-se. Feche os olhos. Esqueça tudo o resto. Abra a mente, entre em alpha ou tetha. Respire. 2 minutos. Abra os olhos e pressione Play. 2 e 2 são 5? Estará com Myxomatose? Existe um lobo à sua porta? Ou prefere sair em direcção à Lua? Não precisa de tentar encontrar justificação para a sensação que o acompanha no fim da audição. Nem para o estranho título e sua conjugação com o que ouviu. Disseram-lhe eles estavam mortos. Não voltariam a ser os mesmos, especialmente depois de "OK Computer". Acredita nisso agora? Tem dúvidas? Então encoste-se. Feche os olhos...

RadioHead - "Hail to the Thief" (2003)

2003/07/12

Livros: Tango! 

Dormi pouco hoje. Acordei, abri os estores das janelas e deixei entrar a luz difusa que passa através do céu encoberto de Lisboa. Escolhi um disco do Astor Piazzolla, coloquei-o a tocar. Agarrei no "Tango" e comecei a ler. É mais um livro de Corto Maltese, escrito e desenhado por Hugo Pratt.

O tango ouve-se ao longo das ruas misteriosas de Buenos Aires dos anos 20. Louise, uma emigrante polaca, amiga de Corto Maltese desde que se cruzaram em Veneza, pediu-lhe ajuda e ele veio em seu auxílio. Corto aparece como um cavaleiro andante que, por amizade, se envolve numa trama complexa que envolve interesses obscuros no submundo argentino.

Pelo meio, surgem vislumbres da primeira passagem de Corto pela Argentina, no início do século, quando conheceu Butch Cassidy, Sundance Kid e Etta Place, os míticos fora-da-lei americanos que procuraram refúgio na Patagónia. E é para o sul que Corto parte no fim do livro. E é para o sul que a sonolência me transporta, para uma Patagónia onde tudo é possível e a imaginação e não é prisioneira dos nossos medos...

2003/07/11

Música: O Palco II 

Lembro-me de ouvir falar numa jovem portuguesa que supostamente cantava jazz de forma extraordinária. Diziam-me que a América, essa grande nação, estava completamente embevecida com esta nova voz, ainda por cima não-americana. Nome curto, Jacinta, uma cara bonita que se conhecia da capa do albúm num sorriso rasgado, e a promessa de blues e jazz ao melhor estilo. Confesso que não comprei o albúm. Ouvi algumas coisas, gostei e marquei na minha agenda o concerto que a moça vinha dar à bela capital alentejana: Évora.

22:00, palco grande, muita gente. Muita gente??? Sabia que assim que começasse o concerto 3/4 iria comer farturas ou beber cerveja numa qualquer carrinha. Não me enganei muito, apenas demorou mais do que pensei. Convenhamos: obras de Thelonius Monk, com arranjos vocais e letras criadas especialmente para este espectáculo... Que me desculpe Jacinta, mas foi demasiado violento. E é pena, pela postura em palco, pela voz forte mas estranhamente maleável, pelo trabalho de bateria de Mário Barreiros...

Gostaria apenas de deixar uma última nota: fazer bidus-dabadu-babababdibupatapatapu pode ser muito estimulante e definir um belo estilo de cantor de jazz, mas ao fim de oito peças em que invariavelmente Jacinta usou esta técnica... enfim... mereciamos mais e melhor.

Vou comprar o álbum só para ter a certeza que a obra gravada é muito melhor e que fui injusto com estas linhas...

2003/07/10

Música: Movimentos Perpétuos 

Encontrei a música antiga feita por gente nova. Provocações! Afirmam os puristas. Construções! Afirmo eu.

Sobre a obra base de Carlos Paredes, vários recentes músicos recriaram espaços, provocaram emoções, dão-nos conforto. A cada faixa do CD (já lá vão as 8 pistas!!!!!) há sedução, há cedências da nossa parte e há entrega. Ao contrário do crítico do "Expresso" (que antes de mais tem de se fazer entender para a maioria das pessoas), creio estarmos perante um momento "chill out", e não só, e que simpático é compreendermos a versatilidade de um instrumento que alguns ainda acreditam feito apenas para um tipo de música.

O convite fica! As 6 cordas dobradas lá estão!

Como consumir - Seleccionar no leitor de CDs "repeat all" , servir com vinho tinto, e respirem (vocês e o vinho)!

Gestão: A herança do Senhor Taylor 

Reli há pouco tempo o texto fundamental de Frederick Taylor, The principles of scientific management. Taylor é considerado, com justiça, um dos precursores da gestão e marcou o início do século XX com as suas ideias sobre a organização "científica" do trabalho que contribuíram para um aumento efectivo da produtividade. As suas ideias partem da convicção de os trabalhadores fazem menos do que podiam fazer para protegerem os seus postos de trabalho. O que ele propõe são formas de combater esse tempo desperdiçado examinando minuciosamente e cronometrando todas as tarefas necessárias para o desempenho de uma determinada actividade. Para o fazer, Taylor defende que se recolha todo o conhecimento dos trabalhadores para que este seja classificado e reduzido a regras, leis e fórmulas.

A principal herança deste pioneiro da gestão é a noção de que a definição e a execução, o pensamento e a acção, devem estar separados. Mas, sendo a principal, esta não é a sua única herança. Taylor também lançou as bases para a gestão obcecada pelo controlo. A passagem mais marcante do livro é o relato de uma conversa do autor com um trabalhador, dominando-o e manipulando-o para que este aceite trabalhar seguindo cegamente todas ordens que lhe derem. "Quando te disserem para andares, andas, quando te disserem para descansares, descansas, e nada de responderes!"

O modelo de liderança de Taylor é, por isso, simples. O gestor presume que lidera um grupo de pessoas incapazes de pensar que precisam de ser conduzidas e pressionadas para fazerem alguma coisa. Obviamente que este é um cenário ultrapassado hoje em dia, na chamada "economia do conhecimento"... Será? Para muito gestores nem por isso, os meios de pressão é que se tornaram mais sofisticados. A moda agora é jogar com a ambição, com a competência e com a auto-estima. Para os mais ousados, a lei da selva é a cereja no topo do bolo através de mensagens inspiradoras mais ou menos explícitas que dizem "lutem por vocês próprios porque nem todos sobreviverão". Não é fascinante ver como a humanidade progrediu tanto em apenas um século?

2003/07/08

Filmes: Quando se torna difícil respirar... 

Vi há umas semanas o trailer de Respiro e decidi ir ver o filme. Já estreou há algum tempo, mas só ontem à noite o consegui ir ver. Não me arrependi. É um retrato cru de uma aldeia de pescadores, algures numa ilha no sul da Sicília, onde os dramas pessoais se cruzam na vida de Grazia (uma interpretação soberba de Valeria Golino), mãe de dois rapazes e de uma rapariga adolescente.

Grazia é considerada louca pela aldeia, incapaz de se conformar com as regras tácitas da sua existência colectiva. Grazia oscila entre a alegria eufórica e a depressão profunda, desencadeada pela violência quotidiana que a rodeia. Grazia recusa-se a aprisionar o seu espírito dentro das fronteiras estreitas da aldeia e das regras ditadas ao fim da tarde pela comadres sentadas nos respectivos quintais. Ao mesmo tempo, os adolescentes e as crianças da aldeia dão largas à violência latente na pequena comunidade em jogos de poder e agressão com iterações infinitas. E é notável assistir ao momento de transição do filho mais novo de Grazia, quando este deixa de ser a criança que apanha peixe atirado pelos pescadores e se transforma no adolescente que se torna pescador e diz aos antigos companheiros que agora tem os peixes todos do mundo.

E o argumento segue o ritmo do vento e das ondas até que Pietro, o marido de Grazia, se deixa convencer que ela tem que ser internada e ela desaparece, deixando todos com a convicção de que terá morrido. Fascinante. E Valeria Golino, aos 36 anos, mantém intacto o seu encanto.

2003/07/06

Música: Sons numa língua estrangeira 

O último álbum de Lloyd Cole é uma surpresa mesmo para quem, como eu, acompanha a sua carreira desde o início. Comprei ontem Music in a Foreign Language e não me arrependi nada. Dez músicas esculpidas cuidadosamente, com o brilho cristalino da guitarra acústica que Lloyd Cole domina a seu belo prazer e a riqueza das palavras de um dos melhores poetas da música actual.

A sonoridade é completamente diferente dos seus trabalhos mais recentes e faz lembrar muito a versão de "Chelsea Hotel" com que Cole contribuiu há doze anos para o álbum de tributo a Leonard Cohen "I'm your fan". Notam-se as influências claras (que o próprio admite) dos primeiros trabalhos de Leonard Cohen ou, se quisermos encontrar outras fontes, do primeiro album de Suzanne Vega, do período inicial da carreira de James Taylor e até de algumas fases de Morrissey.

O álbum abre com o som magnífico do tema que lhe dá o nome. Music in a Foreign Language é uma das composições mais inspiradas de Lloyd Cole, leve mas de uma fina ironia. O disco prossegue com a mesma atmosfera, trazendo-nos canções compostas ao longo de vários anos, como ele diz ao Blitz de 17 de Junho. A ironia de My Alibi ou Cutting Out integra-se perfeitamente num colectivo de canções que inclui mesmo uma versão de People Ain't No Good de Nick Cave. Uma pérola...

2003/07/03

Psicologia: O percurso menos percorrido 

O Público vai lançar a partir de sábado uma nova colecção de livros, desta vez associada à revista Xis, e vai arrancar com um livro extraordinariamente influente. Trata-se de O Caminho Menos Percorrido de M. Scott Peck, editado originalmente em 1978 e que já terá vendido mais de seis milhões de cópias. Um dela foi a minha e li-o há perto de dois meses. É um livro provocador, que desafia algumas das nossas convicções sobre assuntos tão pessoais como a dor e o amor.

Scott Peck defende que a vida é um processo doloroso de confrontar e resolver problemas e que temos de aceitar essa dor, uma vez que evitá-la resultará mais tarde numa dor ainda maior e num bloqueio do nosso crescimento mental e espiritual. Nesse sentido, o autor defende uma forma de disciplina, centrada na coragem para enfrentar os problemas em vez de os evitar. O amor é, para Peck, a força que podemos mobilizar para atingirmos essa disciplina. Mas a definição de amor que o autor evoca é invulgarmente precisa. Amor, neste sentido, é o conjunto de acções que levam ao crescimento da própria pessoa ou de outros. Peck esforça-se por distinguir o amor da dependência ou da paixão, defendendo que o significado normalmente atribuído à palavra está demasiado contaminado por ideias erradas oriundas da noção romântica de cada pessoa tem um parceiro ideal.

Gostei sobretudo da forma incisiva como Scott Peck expõe as suas ideias e dos exemplos que ele evoca para as ilustrar. Não creio que tudo o que Peck diz esteja correcto nem me parece que exista alguma fórmula para percorrer esse caminho menos percorrido, mas as conversas que este livro pode proporcionar, quer connosco próprios quer com os outros, tornam-no numa leitura quase obrigatória. No sábado, este livro vai-lhe aparecer à frente. E que tal se não o deixasse fugir?

2003/07/02

Livros: Um marinheiro entre as brumas 

O crepúsculo do fim de tarde começava a ser substituído pela escuridão da noite, quebrada apenas pelas luzes, poucas, que cintilavam em algumas janelas do prédio em frente. Lisboa parecia submersa debaixo de uma bruma inesperada numa noite de Junho. Abri a janela, tentando em vão seduzir uma aragem perdida. A sala estava iluminada apenas por duas velas e por um candeeiro colocado ao lado do sofá. Escolhi um disco, não me lembro se era de Lisa Ekdahl ou de Norah Jones, ajustei o volume de som e sentei-me no sofá com um gin tónico ao lado. Peguei então, finalmente, no livro. Primeira página...

O livro tinha um título convidativo, As Célticas, um volume das aventuras de Corto Maltese recentemente reeditado em Portugal. Saltei o texto introdutório, voltaria lá mais tarde, e mergulhei na Irlanda de 1917, em luta pela independência. O ritmo da narrativa conduziu-me pausadamente, página após página. Corto Maltese a pairar sobre uma intriga surpreendente, atraído pelo canto triste de uma Banshee e pelos enganos de uma luta difícil. Da Irlanda parto para Stonehenge, onde Oberon chama Merlin para travarem uma invasão da ilha pelos alemães, uma repetição de uma história antiga que bem conhecem. Não podendo agir directamente, despertam Corto Maltese para que ele o faça por eles numa manhã suspensa entre o sonho e a realidade. E sigo até ao fim do livro, por entre a queda do Barão Vermelho e a voz perigosamente hipnótica de Mélodie Gaëlle, mergulhando com gosto no mar melancólico que Hugo Pratt encheu com o seu talento para contar histórias.

Fechei o livro. O disco tinha acabado há muito e uma brisa tinha finalmente despertado. Lá fora, a bruma mantinha-se e a cidade parecia dormir desde as suas colinas até ao rio. Devo ter imaginado que, ao longe, para lá da foz do Tejo, se ouvia o canto triste de uma Banshee. Fechei os olhos e acredito que adormeci.

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