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2003/10/28

Livros: Um louco como nós 

Cruzei-me há poucos dias com um livrinho pequeno, fininho e com uma imagem estranha na capa... O título, em letras cor de laranja, anunciava que se tratava do Diário de Um Louco de Nikolai Gógol. Abri-o ao acaso e comecei a ler. Fiquei fascinado, levei o livro para casa e li-o num ápice.

O autor do diário é um pobre funcionário, imerso no seu pequeno mundo e receoso da inveja que o chefe de secção terá por ser ele quem afia as penas do director. Aliás, o director só pode ser um homem brilhante, uma vez que fala tão pouco... E está tudo no Diário. O breve encontro "mágico" com a filha do director, a intercepção das cartas trocadas entre duas cadelinhas e o grande final, a apoteose em glória do funcionário que descobre o seu futuro grandioso.

Gógol nasceu na Ucrânia no início do século XIX e é considerado o fundador do "realismo crítico" na literatura russa. Mas isso não interessa nada. O que importa é que este livro é bom, mesmo muito bom. Gostei e recomendo.

2003/10/24

Música: Esta noite a chuva regressa... 

Lisboa vai ser atingida por chuvas tropicais durante a noite de hoje e de amanhã. As previsões dos metereologistas indicam que o centro da tempestade se localizará na Aula Magna da Universidade de Lisboa onde, nas duas noites, a partir das nove e meia, John Cale sobe ao palco para dois concertos.

Cale é uma figura única. Galês, começou a sua viagem pela música dita erudita. Os seus estudos conduziram-no aos Estados Unidos nos anos 60, onde encontrou Lou Reed e, com ele, formou os míticos Velvet Underground. A simbiose criativa não durou muito e após dois discos a magia desfez-se e Cale partiu para uma viagem solitária que o tem levado ao longo das margens de um rock estranho, pessoal e atormentado. Afinal, foi John Cale quem escreveu que o medo é o melhor amigo do homem...

A minha porta de entrada para o universo de Cale a solo foi um registo ao vivo. Fragments of a Rainy Season é o nome do disco que reúne vinte músicas nas quais John Cale se acompanha a si próprio martelando furiosamente o piano ou torturando uma pobre guitarra folk. Mas é dessa intensidade que vive o disco, uma intensidade contida que por vezes explode. Estou curioso. Que nos trará ele desta vez?

2003/10/23

Música: Momentos únicos 

É muito raro, mas há quem tenha o dom de captar momentos em palavras, imagens ou sons. Maria Catharina Linnemann capta-os com a sua sensibilidade e devolve-os ao mundo com a sua guitarra. As suas composições são melodias aparentemente simples, com harmonias subtis, sem virtuosismos mas que exigem de quem toca nada menos do que uma entrega total.

Descobri o trabalho dela há dez anos, quando estava a começar a aprender a tocar guitarra clássica. Um dia, o meu professor entregou-me uma partitura. Apenas uma folha com o título Murmures (whisperings). "Acho que vais gostar..." E gostei mesmo. Apaixonei-me por aquela pequena peça de música e essa folha ainda hoje me acompanha, amarelecida e anotada.

Há pouco mais de um ano, procurei esta misteriosa autora através desta rede imensa. Nenhuma página própria, nenhum disco na Amazon... Finalmente uma pista, através de um guitarrista alemão. Não tem mesmo página na web, está a viver no Japão onde trabalha como professora de alemão e só tem um disco editado. Parti à procura desse disco e encontrei-o com dificuldade numa pequena loja online belga. O disco chama-se Recaptured Moment e é ainda mais belo do que eu alguma vez imaginei. Uma pérola a descobrir... E a partilhar...

2003/10/17

Música: Jóia 

Pedro Jóia assina com 6 cordas aquilo que o Mestre paredes escreveu com 12. Variações sobre Carlos Paredes é um disco simples mas confortável. Ouve-se e vai entrando na pele. Deve estar escondido nas lojas, longe dos destaques, é um daqueles que dá gozo descobrir. Foi-me trazido por uma amiga. Assim devia ser sempre. Será derrotista dizer que não olhamos para para aquilo que fazemos de bom. O Pedro Joia é dos bons e digam lá se a pele não se arrepia e relaxa...

2003/10/14

Livros: E por falar em prisão... 

«Nós vamos falar de prostitutas. Mas não vamos falar: das "esposas" dos vários níveis sociais, desde as altas instituições à pequena burguesia, que vivem de ser casadas. Ou seja, que venderam o corpo legalmente. Iconoclastia das nossas adolescências contra essa mulher-tipo (Salazar). Partíamos a loiça toda. E hoje também. (...) Nem das prostitutas elegantes, de apartamento luxuoso, que constam das listas especiais. (...) Nem das "filhas boas de familias más, que andam com os filhos maus de famílias boas", vivendo de coisa nenhuma, ou seja, permanecendo no grupo e à custa do grupo, porque "boas" e disso vivendo. (...) Nem tão pouco das prostitutas que estão nas casas clandestinas. Nenhuma dessas categorias é presa. Nós vamos falar da outra.

Da que está no degrau mais abaixo da escada. Nós vamos falar da prostituta de rua, da prostituta de estrada. Da pobre, que é frequentada, sobretudo, por homens pobres. E que integra, afinal, o grande e miserável exército da prostituição.

Ela, a única considerada vadia.
E por isso presa.
É a puta de prisão

in Puta de Prisão, de Isabel do Carmo e Fernanda Fráguas

Quatro mulheres que tiveram o privilégio raro de observar por dentro aquilo que geralmente é observado de fora. E se fosse hoje, o que mudaria?

2003/10/06

Música: Encontrar o Norte... 

Há discos que revelam a tranquilidade e maturidade de quem os grava. Descobri que é esse o caso de North, o vigésimo disco de Elvis Costello. É desarmante ouvir neste disco a sua voz madura e suave, suportada por ele próprio ao piano, por uma bateria, um baixo, uma secção de sopros e outra de cordas. E o Norte procura-se com canções de amor, intimistas, aparentemente simples e extremamente belas; objectos clássicos que só por mero acaso esperaram por 2003 para nascerem.

Costello começou a sua carreira na segunda metade dos anos 70 e foi construíndo, canção a canção, disco a disco, a reputação de ser um escritor de canções só comparável a génios como Lennon e McCartney. Ainda assim, ele nunca se tornou num fenómeno de popularidade, nem me parece que tenha procurado verdadeiramente um lugar de estrela. Preferiu encontrar o seu rumo estético, com a tranquilidade de quem sabe bem o quer. E ainda bem que o fez. Só quem tem razões para estar feliz com a vida é que poderia escrever aos 48 anos canções tão extraordinárias como "Still" ou "Can you be true?", e essas são apenas duas das 12 que ele nos oferece em North. Indispensável.

2003/10/03

Música: Somos todos feitos de estrelas 

Nunca me deixei verdadeiramente seduzir pela música de dança. Parecia-me demasiado artificial e mesmo um ligeiro fascínio de DJ adolescente passou depressa. Redescobri há pouco tempo que há sabores na música de dança que vale a pena conhecer. Um desses sabores encontra-se na música de Moby.

Tinha lido sobre ele no Blitz quando veio tocar a Portugal, em Julho, mas nunca tinha ouvido nada dele. Achei piada à forma como disse à entrevistadora que George Bush o fazia ter vergonha de ser americano, que se considerava um músico underground tornado comercial por acidente e que a única banda portuguesa que conhecia eram os The Gift e que gostava deles... Visitei o site dele e diverti-me a ler o diário da tournée e a forma como recomendou um restaurante vegan que encontrou no Chiado. Descobri que, apesar do seu nome verdadeiro ser Richard Melville Hall, lhe chamam Moby por descender de Herman Melville, o autor de "Moby Dick".

Mas já tinha descoberto isto tudo sem nunca o ter ouvido quando, há um par de semanas, me apeteceu ouvir uma coisa diferente do que tinha em casa. Tinha que passar o fim-de-semana a escrever e precisava de variar a banda sonora... Fui à FNAC do Chiado e o álbum 18 do Moby estava lá à minha espera... Rendi-me logo na primeira faixa. We are all made of stars.

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